12 de dezembro de 2022
Entrevista com o autor, arquiteto e professor Stefan Al, sobre seu novo livro Supertall e a ascensão das cidades arranha-céus.
Stefan Al é o autor de Supertall: How the World’s Tallest Buildings Are Reshaping Our Cities and Our Lives (Norton, 2022). Al é PhD em Planejamento Urbano e Regional pela University of California, Berkeley. Ele trabalha como arquiteto e lecionou na Virginia Tech, na Columbia University, no Pratt Institute, na University of Hong Kong e na University of Pennsylvania.
Sobre Supertall
Em relação ao seu novo livro, Supertall, qual é o seu principal argumento e quais são as ideias-chave que você deseja que os leitores tenham?
Stefan Al: Até 2050, estima-se que mais 2,5 bilhões de pessoas viverão em cidades. Além de novas moradias, esse impulso urbano exigirá um aumento maciço na infraestrutura da cidade, incluindo estradas, calçadas, parques e transporte, bem como esgoto, água e linhas de energia. Isso é como construir uma nova cidade de Nova York todos os meses pelos próximos trinta anos. Se fôssemos construir Phoenixes (cidade do Arizona, EUA) espraiadas, desperdiçaríamos muito mais energia no transporte e vinte vezes mais terras com risco ambiental. Não precisamos castigar tanto a terra se pudermos subir ao céu.
Embora a vida em arranha-céus talvez não seja para todos, muitas pessoas preferem estar nos grandes centros urbanos, perto de escritórios, restaurantes e estações de transporte. Arranha-céus podem ser construídos nesses locais. Quanto mais centros urbanos viáveis tivermos, menos nossas cidades terão que se espalhar.
Inovações em arranha-céus
O que você vê como as principais inovações tecnológicas que permitiram que os edifícios fossem cada vez mais altos no século 21?
Stefan Al: Com novas tecnologias de fabricação e ampla disponibilidade de simulações de software para vento e cargas estruturais, está se tornando mais fácil tornar as estruturas mais eficientes em termos de material. Os componentes estruturais, como barras de aço e pilares de concreto, costumavam ser predominantemente retos.
Agora, a impressão 3D pode imprimir materiais em qualquer formato e fazer moldes personalizados para formas de concreto mais elaboradas. A fabricação mecanizada permite que os projetistas ignorem as plantas e se comuniquem diretamente com as máquinas, permitindo formas mais complexas, como as formas curvilíneas otimizadas para reduzir os vórtices de vento que edifícios muito altos criariam.
Com uma paleta mais ampla de formas à sua disposição, os engenheiros também podem criar estruturas que transferem as forças horizontais para o solo de maneira mais natural e eficiente. Com menos peso dedicado às estruturas, o próprio edifício pode se tornar mais alto.
Skyline de Manhattan. (Imagem: lukas.b0/Flickr)
A ascensão dos arranha-céus às alturas
O que está impulsionando esse movimento em direção a arranha-céus cada vez mais altos?
Stefan Al: A urbanização acelerada provou ser um grande vento a favor dos arranha-céus, particularmente na Ásia. O século XXI é o primeiro século urbano. Nunca antes a maior parte da população mundial viveu em cidades, atraídas pelas muitas e diversas oportunidades da vida urbana.
Alguns países decidiram, inclusive, basear sua política nacional na relação positiva entre urbanização e crescimento econômico. A China adicionou cerca de meio bilhão de pessoas às suas cidades. Não é de surpreender que tenha o maior número de arranha-céus do mundo.
Da mesma forma, por que você acha que houve um surto de crescimento maciço no número de arranha-céus (digamos, edifícios de 150 metros ou mais) em todo o mundo no século XXI?
Stefan Al: O que é surpreendente é que os arranha-céus estão até mesmo alterando cidades históricas que eram inóspitas para o crescimento urbano. Por três séculos, o horizonte de Londres foi definido pela Catedral de St. Paul, com sua silhueta de cúpula e pináculos.
Então, nas décadas de 2000 e 2010, surgiram arranha-céus mais incomuns e muitas vezes mais altos, enchendo o horizonte com formas engenhosas que lhes valeram seus apelidos, como o Gherkin (pepino), o Walkie-Talkie e o Cheesegrater (ralador de queijo). No caso de Londres, as novas preferências sociais e o desejo de crescimento econômico ajudaram a afrouxar as restrições de planejamento enfrentadas pelos novos arranha-céus.
Arranha-céus e cidades
Como esse surto de crescimento afeta as cidades (para o bem ou para o mal)?
Stefan Al: Os arranha-céus podem ter impactos negativos nas cidades, como o aumento do congestionamento do tráfego, a falta de escala humana e a restrição das vistas. Mas com um bom planejamento, esses problemas podem ser minimizados. Ainda mais, quando bem feito, as cidades podem usar o desenvolvimento de arranha-céus como uma oportunidade para melhorar a qualidade de vida dos moradores.
Por exemplo, uma abordagem cuidadosa na construção de arranha-céus torna possível aumentar as áreas verdes, melhorar o transporte público e aumentar a vitalidade de uma cidade. Os incentivos LUSH de Cingapura (Landscaping for Urban Spaces and High-rises, ou paisagismo para espaços urbanos e arranha-céus), ilustram como as normas podem ajudar a promover uma nova geração de arranha-céus “verdes”, com edifícios altos integrados à vegetação.
Hong Kong mostra como integrar estações de metrô em complexos de arranha-céus, tornando-se talvez o melhor exemplo mundial de Desenvolvimento Orientado ao Transporte. E o modelo Tower and Townhouse de Vancouver — torres residenciais esguias sobre uma base de uso misto, geralmente contendo casas geminadas — ilustra como minimizar o impacto de edifícios altos nas vistas, oferecendo aos pedestres uma experiência de pedestre em escala humana.
Arranha-céu Taipei 101, em Taiwan. (Imagem: JS Hsu/Flickr)
Petronas Tower, Kuala Lumpur, Malásia. (Imagem: Tarik Abdel-Monem/Flickr)
Controvérsias sobre os arranha-céus
Por que você acha que os arranha-céus, especialmente os muito altos, se tornaram tão controversos na última década? E de que maneira as cidades podem abordar essas controvérsias?
Stefan Al: Uma das razões é a reação à novidade. Torres muito altas podem ser consideradas “altas demais” em proporção ao seu entorno. Até a Torre Eiffel, durante sua construção em 1887, foi desprezada pela elite da cidade como “uma torre vertiginosamente ridícula dominando Paris como uma gigantesca chaminé negra”.
A cidade considerou seriamente demoli-la e vendê-la como sucata. O próprio Gustav Eiffel ergueu uma antena e financiou experimentos com telegrafia sem fio para provar a utilidade da torre oca. Com os militares franceses reconhecendo a recém-descoberta utilidade da torre, um comitê parisiense com autoridade para o destino da estrutura relutantemente a deixou permanecer. “Gostaria que fosse mais bonito”, afirmou o comitê.
“Quid pro quo” é uma das lições aqui. O Rockefeller Center ofereceu aos nova-iorquinos mais do que uma coleção de edifícios altos para contemplar, deu também uma notável praça pública para aproveitar. O rezoneamento de Midtown East em Manhattan oferece aos desenvolvedores mais área construída se eles contribuírem para o bem-estar público por meio de melhorias no trânsito, como no caso da torre One Vanderbilt, que contribuiu com uma praça para pedestres e um espaço para transporte.
O futuro do arranha-céu
Qual é o futuro do arranha-céu?
Stefan Al: Apenas pelas razões ambientais, a maneira como projetamos nossos edifícios mais altos precisa mudar. Os arquitetos estão obrigados por uma espécie de “juramento de Hipócrates” ao espaço público e à gestão ambiental. Em vez de apenas pensar em como obter estruturas de aparência mais alta, eles também devem criar edifícios com pegadas ambientais menores.
Precisamos recalibrar a corrida pelo prédio mais alto. Devemos almejar que os edifícios sejam os mais verdes, com mais paisagismo e menos emissões de carbono. Precisamos de arranha-céus para gerar o máximo de energia renovável, produzir mais alimentos e promover os ambientes mais saudáveis para os residentes com os maiores benefícios biofílicos.
Precisamos de edifícios altos construídos com todo o seu ciclo de vida em mente e que sejam desmontados no final. Precisamos dos edifícios mais resilientes, capazes de resistir aos estragos das mudanças climáticas, não apenas com um design prático, mas também com estética e beleza.
A boa notícia é que muitas tecnologias de eficiência energética e soluções de energia renovável estão disponíveis comercialmente hoje e já estão sendo aplicadas. Equipamentos de energia renovável, madeira laminada cruzada, módulos pré-fabricados e isolamento térmico estão causando um impacto positivo. Agora precisamos de muito mais.
Apesar dos avanços em inteligência artificial e robótica, o ambiente construído ainda é uma indústria de tijolo e argamassa, intensiva em capital e localmente fragmentada. ela tende a ficar para trás. A grande maioria dos edifícios se tornará mais verde apenas se os regulamentos os forçarem e os incentivarem a fazê-lo.
O futuro das cidades
Você tem um PhD em Planejamento Urbano e Regional e também exerce a profissão de arquiteto. Dado o seu histórico, quais você vê como os principais desafios que as cidades enfrentam no século XXI?
Stefan Al: A mudança climática, o crescimento da população urbana e o preço inacessível da moradia já estão impactando a vida na cidade. O desafio é como construir nossas cidades para abrigar mais pessoas, como construir de forma mais sustentável e equitativa e como construir para absorver os choques que virão da ocorrência crescente de eventos climáticos extremos, como inundações e ondas de calor.
Adaptação às mudanças climáticas
Você também escreveu o livro Adapting Cities to Sea Level Rise: Green and Gray Strategies. Quais são as ideias-chave deste livro? Você vê cidades empregando as estratégias em seu livro? Se não, por que não?
Stefan Al: Tendo crescido na Holanda, um país que durante séculos lutou contra o oceano, há muito tempo admiro suas soluções holísticas para se proteger contra inundações. No entanto, depois de vários eventos de inundação em outros lugares, como o furacão Katrina em Nova Orleans, testemunhei a construção de novos paredões que obstruem a visão das pessoas e o acesso à orla.
Em vez disso, em meu livro, defendo abordagens de proteção contra inundações baseadas na natureza, integradas ao espaço público e sensíveis às condições locais e à comunidade. Dessa forma, a proteção contra inundações também pode beneficiar comunidades e ambientes de outras maneiras.
Por exemplo, a construção de infraestrutura de gerenciamento de enchentes em áreas urbanas pode ser particularmente difícil em cidades densas onde a terra é escassa. Felizmente, recentemente várias soluções inovadoras abordaram esses problemas, integrando soluções de inundação ao espaço público e aos usos urbanos. Isso inclui as defesas multifuncionais contra inundações em Roterdã. O Dakpark (parque na cobertura) é um dique que também inclui uma estrutura para comércio e estacionamento e um parque.
Nova York está considerando várias dessas estratégias para o sul de Manhattan.
Publicado originalmente em Building the Skyline em agosto de 2022. Traduzido por André Sette.
Fonte: Caos Planejado
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