17 de setembro de 2020
Menos de um ano após alcançar a marca de 500 mil investidores, os fundos imobiliários comemoram a marca de um milhão de pessoas físicas.
Impulsionados pelo contexto de queda dos juros, com o brasileiro buscando alternativas mais rentáveis diante de prêmios irrisórios na renda fixa, os fundos imobiliários registram no ano um crescimento de 57,2% na base de cotistas.
O número, que correspondia a 12 mil contas em 2009, teve seu grande salto em 2019, quando mais que dobrou em relação ao ano anterior, para 645 mil. Vale lembrar que um investidor pode ter conta em mais de uma corretora, por isso, o número não reflete necessariamente o total de investidores individuais.
A indústria de fundos imobiliários na Bolsa responde hoje por um mercado de R$ 105 bilhões, com um volume médio diário negociado, no ano, de R$ 214 milhões. São mais de 480 fundos imobiliários, dos quais 327 listados na B3.
E, mesmo em meio à crise, o mercado está a todo vapor. No ano até agosto foram feitas 48 ofertas públicas de fundos imobiliários – um aumento de 41,2% em relação às 34 ofertas realizadas no mesmo período de 2019.
Quando comparado com o mercado de ações, contudo, o espaço para crescer ainda é substancial. O volume médio diário negociado no segmento em 2020 é de R$ 29 bilhões, com mais de 500 empresas listadas na B3.
Carlos Martins, sócio e gestor responsável por fundos imobiliários na Kinea Investimentos, conta que, diante de juros historicamente altos no Brasil, o grande desafio para a indústria de FIIs sempre foi fazer com que os investidores testassem o modelo, uma vez que era muito mais confortável e atraente investir na renda fixa.
Com a taxa básica de juros a 2%, contudo, a história é outra. “A grande diferença de outras crises para esta é que a grande maioria dos investidores percebeu que, por conta dos juros baixos, não teria mais onde colocar o dinheiro”, avalia.
Por mais que a cota caia, diz, os fundos imobiliários ainda oferecem dividendos interessantes e aqueles que não estão pagando por conta da crise, como shoppings, por exemplo, têm a possibilidade de voltar a pagar rendimento no futuro.
No ano, o Ifix, índice que acompanha os FIIs listados na B3, tem desempenho negativo de 12,7%, enquanto o Ibovespa cai 13,3% e o CDI tem variação de 2,2%.
A opinião é compartilhada por William Eid Júnior, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getúlio Vargas. “O crescimento é natural, porque estamos sem alternativas para investimento. Antes, era possível comprar um CDB ou uma LCI e ter juros reais de 4% a 5%, mas isso acabou. Hoje, se pegarmos um imóvel bem alugado, ele pode render 6%, bem mais que os juros atuais”, diz.
Novos investidores
O profissional de educação física Gabriel Anzolin, 26, começou a investir em fundos imobiliários em maio, quando abriu sua conta em corretora e passou a receber conselhos de seu amigo e assessor de investimentos.
Além da poupança criada pelo pai, Anzolin nunca tinha investido. O primeiro passo foi montar uma reserva de emergência, em fundos de renda fixa, e depois alocar em um fundo multimercado. A etapa seguinte foi aplicar em FIIs, com o auxílio do assessor.
Hoje, Anzolin, que tem perfil de risco moderado, investe em três fundos: um de logística, outro híbrido e o mais recente deles, um FII de recebíveis imobiliários.
Com foco no longo prazo, o investidor conta que acompanha semanalmente as cotações dos fundos em que investe de forma a monitorar novas janelas de compra das cotas.
“Gosto dos fundos imobiliários porque é a única forma de investir em grandes imóveis. Se não fosse no fundo, não teria como eu investir em um shopping, em um galpão logístico do nordeste, nem nos prédios comerciais que passo sempre na frente, na Faria Lima”, diz.
Anzolin faz parte do novo público de investidores de renda variável que, segundo Felipe Paiva, diretor de relacionamento com cliente da B3, é mais jovem, se preocupa em diversificar seus investimentos e começa a montar sua carteira com investimentos em valores baixos.
Liquidez, dividendos e isenção de IR
Considerado o meio do caminho entre a renda fixa e a renda variável “pura”, os fundos imobiliários têm características que, no cenário atual, os tornam uma oportunidade de investimento muito atrativa, afirma Leandro Bousquet, sócio da Vinci Partners.
“Eles combinam bom retorno com baixa volatilidade. Além disso, por sua estrutura e regulação, precisa distribuir resultado semestralmente e a maioria paga de forma mensal, o que torna a classe ainda mais interessante”, diz.
A avaliação é compartilhada por André Freitas, diretor da Hedge Investments, que chama atenção ainda para a isenção de Imposto de Renda para a pessoa física sobre os dividendos pagos. “Estamos aumentando a qualidade dos fundos, a liquidez e a competitividade em relação à Selic é muito grande”, afirmou, durante evento promovido pela casa de análise Eleven Financial, no fim de agosto.
Evolução dos FIIs
Com uma indústria que começou muito focada nos fundos monoativos, isto é, com um único imóvel na carteira, e com gestão passiva, buscando replicar o desempenho de um índice de referência, diz Bousquet, da Vinci, o mercado de fundos imobiliários entrou em uma nova fase muito positiva e promissora, a partir de 2017, evoluindo na diversificação dos portfólios e na maior qualidade da gestão e informação para o investidor.
Renan Manda, analista de fundos imobiliários da XP, chama atenção para a maior participação de investidores institucionais, como fundos de pensão e fundos de investimento, que entram no mercado de FIIs com uma visão mais fundamentalista, de longo prazo, permitindo à indústria o desenvolvimento de novas estratégias.
É o caso do desenvolvimento imobiliário e do uso em FIIs de alavancagem, utilizada para multiplicar a rentabilidade por meio de endividamento.
Próximos passos: ETFs e aluguel?
Com o crescimento do mercado de fundos imobiliários em tamanho e número de investidores, os próximos passos da indústria devem incluir novas possibilidades da utilização dos FIIs.
Segundo Paiva, a B3 está em constante discussão com o mercado para trazer à Bolsa os ETFs de fundos imobiliários.
“Pensando nisso, reformulamos a metodologia do Ifix, aumentando os critérios de liquidez para a entrada de fundos na carteira teórica, o que contribui para que seja replicável por um ETF”, afirma o executivo.
Além disso, o aluguel de cotas de FIIs, como acontece com as ações, também está na pauta da Bolsa e deve ser anunciado até o fim do ano, segundo Paiva.
Principais erros ao investir
Entre os principais erros que investidores cometem ao investir em fundos imobiliários, Martins, da Kinea, destaca a escolha de fundos com base apenas nos dividendos.
“O investidor ainda olha muito para o dividendo e não para o que tem dentro do fundo imobiliário. Ele precisa entender a estratégia e o porquê de um fundo pagar mais que outro similar”, avalia.
Por mais que alguns investidores busquem a valorização das cotas, no curto prazo, Martins afirma que o investidor deve ter um horizonte, mínimo, de dois a três anos no investimento. É preciso ainda acompanhar o fundo, ler os relatórios da gestão, e alocar tempo para, pelo menos uma vez por mês, saber o que está acontecendo com o fundo, diz.
O analista de fundos imobiliários da casa de análise Eleven Financial, Raul Grego, concorda. “É preciso saber a dinâmica do segmento, os ativos que compõem o portfólio e fazer um investimento em fundos com bons fundamentos, como um bom contrato, como os atípicos, em fundos de logística”, afirma.
Antes de investir, além de analisar o histórico do fundo, Eid Júnior, da FGV, afirma que o investidor deve prestar atenção para o futuro dos segmentos, dado a mudança de cenário com a pandemia. “Tem que ter cuidado para não entrar sem saber o que está comprando”, assinala.
Martins lembra ainda que o investidor precisa ter em mente que os fundos imobiliários, apesar da renda periódica, não são produtos de renda fixa. “A cota varia e o dividendo não é fixo, varia de acordo com as receitas, taxa de vacância etc.”
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