5 de julho de 2023
Diferentemente da crença popular, os meses que antecederam o aniversário de 30 anos do mercado de fundos imobiliários se mostraram o oposto de um “inferno astral”. O segmento fechou o primeiro semestre com um dos melhores retornos da renda variável, de 10,05%, impulsionado pelo ambiente de incertezas menores e com a expectativa de queda de juros em breve.
Os FIIs chegaram às três décadas de criação em junho com muitas marcas a comemorar. A base de investidores pessoas físicas de fundos listados alcançou 2,163 milhões de CPFs, segundo dados da B3 relativos a maio. E, a cada ano, o patrimônio líquido tem subido a um ritmo constante. De acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), os veículos do segmento registraram um PL de R$ 257,17 bilhões, na maior cifra da série histórica, em maio.
O marco de criação do mercado remonta a 25 de junho de 1993. Na ocasião, o governo do então presidente Itamar Franco sancionou a Lei 8.668, que criou o veículo de investimento. O lançamento do primeiro FII ocorreu seis meses depois, em janeiro de 1994. Foi o Memorial Office, que negocia na bolsa com o “ticker” FMOF11.
Apesar do crescimento expressivo tanto em termos de quantidade de investidores, quanto de tamanho do mercado, o consenso entre gestores é que a indústria ainda pode aumentar muito. “Podemos dobrar o número facilmente nos próximos cinco anos, saindo de 2 milhões para 4 milhões de CPFs”, afirma o sócio e gestor de fundos imobiliários da Kinea, Flavio Cagno. “Tendo a achar que, no médio prazo, a quantidade de pessoas físicas [no mercado de FIIs] pode ser maior do que a base que investe em ações”, acrescenta.
Para o CEO da Cy Capital, Gustavo Rassi, a tendência é a de que a base de investidores dobre de tamanho no médio prazo, como uma continuidade do movimento visto nos últimos anos. “É possível que a quantidade de CPFs suba para 4 milhões, porque o mercado tem ainda muito potencial para crescer”, pontua. “Com a evolução do segmento, os investidores viram que tem liquidez no [mercado] secundário, além disso, como o conhecimento sobre o funcionamento do mercado se disseminou, temos uma escalada natural [de interesse]”, complementa.
Nos EUA, mercado de capitais mais desenvolvido do mundo, os chamados “reits” (sigla para “real estate investment trust”), que podem ser traduzidos livremente como fundos de investimento imobiliário, são um segmento com mais de US$ 1,2 trilhão em valor de mercado. Trata-se de um tamanho mais de 22 vezes maior do que o mundo dos FIIs no Brasil.
Indústria de FIIs trouxe crescimento e diversificação de oferta de crédito para empresas” — Flávio Cagno
O CEO da Tellus, Andre Abreu Pereira, explica, porém, que o valor dos reits americanos difere dos FIIs brasileiros. “Nos EUA, o ‘valuation’ é maior porque os reits podem ter dívida diretamente e no Brasil não”, afirma. “Mas o tamanho do mercado lá fora fornece uma noção do que podemos esperar nos próximos 20 anos para o setor”, acrescenta.
Cagno, da Kinea, também pondera haver um componente cultural para expressar sua visão positiva em relação às perspectivas de crescimento do mercado. “Temos um aspecto cultural da nossa herança Ibérica [que remonta ao período de colonização portuguesa] de gostar de imóveis e querer ter renda mensal relativamente previsível”, diz. Além dessa tradição, o gestor lembra que o principal atrativo vem da isenção de imposto de renda sobre os dividendos distribuídos pelos fundos.
O gestor pondera ainda ver potencial para o mercado de FIIs obter um impulso ainda maior do que na onda de crescimento mais recente entre 2017 e 2023. Nesse intervalo de pouco mais de cinco anos, para se ter uma ideia, a quantidade de CPFs da base de investidores em fundos listados saltou de 121 mil pessoas, em dezembro de 2017, para 2,17 milhões, em maio deste ano, segundo a B3. Houve uma expansão de quase 18 vezes no número de pessoas físicas no segmento.
O patrimônio líquido da indústria no mesmo período mais que dobrou. Em dezembro de 2017, segundo a Anbima, o segmento tinha um PL de R$ 114 bilhões. Em maio deste ano, a cifra atingiu R$ 257 bilhões, com crescimento de 2,25 vezes em um intervalo de pouco mais de cinco anos.
O gestor da Kinea explica que a criação dos FIIs representou uma fonte importante de financiamento para o setor imobiliários. “Sejam FIIs de tijolo [que investem em propriedades físicas] ou de papel [com foco em CRIs, os certificados de recebíveis imobiliários], os veículos conseguiram trazer uma fonte de financiamento com custo competitivo e de longo prazo, como alternativa às linhas tradicionais dos bancos”, avalia.
Na análise de Cagno, “houve crescimento de oferta de recursos para empresas de diversos segmentos, como multipropriedades, por exemplo, onde os bancos nunca atuaram”. Além disso, pontua o especialista, “as linhas podem ser de longuíssimo prazo, porque a maior parte dos fundos não tem período de encerramento”.
Na avaliação de Pereira, da Tellus, “a oferta e capilaridade do crédito para empresas aumentou com o surgimento dos FIIs”. Segundo o CEO da gestora, “os bancos fazem seu papel, mas não conseguem dar conta de tudo”.
O especialista pondera ainda que o mercado de fundos imobiliários já abrange mais de 800 FIIs. “Isso ajuda a ter um mercado [de crédito corporativo] mais eficiente e eficaz”, afirma.
Fonte: Valor Econômico
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